quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Os meninos voadores

Não escrevo desde a guerra, que Israel teima em chamar de "a operação militar do último verão", o que me deixa com sabor de ter assistido ao filme da sala ao lado. Por trauma, medo, ou simplesmente para tirar a poeira dos ombros e tentar encontrar um mínimo de possibilidade de vida entre os escombros internos, o pessoal de Gaza silenciou-se. Todos, sem exceção, procuram encontrar alguma forma de deixar a região, ideia que tem um misto de luta incansável e sonho distante. Sinto saudades, quero abraçar todos eles, e compartilho do mesmo silêncio ensurdecedor. 

Recentemente um garoto do time local de parkour, juntou-se a nós. A legenda da fotografia desses meninos voadores traz o senso de humor que não se deixa abater e que me faz sorrir: "a vida em Gaza está mesmo difícil - Israel baniu até a lei da gravidade!" A professora israelense logo se antecipa: "mas vocês não se quebram todos?" E começamos a trocar ideias de como fazer chegar até eles algum equipamento de segurança. Ironia do destino.

Os israelenses estão apavorados. Minha amada Jerusalém transformou-se em palco de ataques terroristas, preconceito, ódio e desejo de vingança. Meu coração se apequena ao pensar naquela gente, naquela paisagem que tanto me inspira a alma. Ai, se eu me esquecer de ti.... Mais uma vez, converso com israelenses e palestinos, preocupada, atrás de notícias. A situação na Cisjordânia também não anda nada boa. "Preciso do teu abraço" - me escreve o palestino de Hebron - "ando tão triste". E seguimos nossa jornada virtual, na certeza de que alguém se importa, em ambas as direções.

Achava graça quando pedia informações nas ruas de Israel, e sempre recebia a mesma resposta: "vá, reto, reto, até o final, até que não haja saída". O que acontece quando não temos mais saída? As esperanças diluídas, uns poucos lutando bravamente, bonecos, cartazes e espírito de comunhão: "árabes e judeus se recusam a ser inimigos", mas a imensa maioria se rende ao medo. Não julgo, não tenho este direito. Posso, talvez rezar, acender umas velas. Posso conversar, promover o encontro, mas não posso negar o sentimento de impotência que me invade a cada manhã quando leio as notícias. Que Deus, em Sua eterna misericórdia, se apiede de nós.

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